O Programa Nacional de Promoção da Saúde Oral continua a ser uma das principais ferramentas na prevenção das doenças dentárias entre crianças e jovens. No Centro de Saúde de Alverca, as duas higienistas orais responsáveis por esta área na Unidade de Saúde Local do Estuário do Tejo, revelam que, apesar do esforço realizado junto das escolas e famílias, persistem desigualdades de acesso e dificuldades na adesão aos cheques dentista.
Ângela Rodrigues, higienista oral desde 2002, explica que o trabalho começa nas escolas. “Desenvolvemos o programa muito associado aos chamados cheques dentista. Fazemos rastreios nas escolas, avaliamos as crianças dos 7, 10 e 13 anos e, quando encontramos cárie em dente definitivo, encaminhamos diretamente para a dentista”, descreve. Quando não há cáries, as crianças são chamadas ao centro de saúde para consultas de higiene oral, onde são feitas destartarizações, selantes, e ensinadas técnicas de escovagem.
A profissional acompanha uma área que inclui Alverca, Alhandra, Sobralinho, Bom Sucesso e Cotovios, onde encontra realidades distintas. “Em Alverca há uma classe média alta com mais acesso ao privado. Mas em zonas como Alhandra e Bom Sucesso nota-se mais carência. Veem-se muitos casos de higiene deficiente ou inexistente”, refere. Entre as dificuldades mais comuns destaca-se a falta de rotina. “De manhã é complicado, porque os pais têm pressa. E muitas crianças passam o dia com avós que lhes dão muitos doces”, explica.
Razões para a baixa utilização dos cheques dentista
A higienista sublinha que a adesão aos cheques dentista continua a ser baixa. “Na última vez que analisei os dados, a utilização dos primeiros cheques estava abaixo dos 30 por cento”, refere. As razões passam pela falta de informação e pela necessidade de os encarregados de educação marcarem a consulta por iniciativa própria. “O cheque dentista não vem com consulta marcada. Depende de os pais ligarem para a clínica, e nem sempre isso acontece”, lamenta.
Já Filomena Jesus, higienista oral na Póvoa de Santa Iria, confirma que o panorama tem melhorado, apesar de oscilações ao longo dos anos. “O índice de tem vindo a diminuir. Temos menos dentes cariados, perdidos ou obturados, o que quer dizer que o nosso trabalho está a resultar”, afirma. No entanto, após a pandemia foi notada uma regressão. “Depois da Covid apareceu mais cárie em crianças muito pequeninas, de 6 e 7 anos. Estando em casa, comeram mais e cuidaram menos.”
Filomena destaca também que surgem mudanças no desenvolvimento dentário. “Vejo crianças de cinco anos já a trocar dentes. E algumas de dez anos muito adiantadas na dentição. É algo que não se via com esta frequência.” A adesão aos cheques dentista na Póvoa de Santa Iria também não ultrapassa os 35 por cento. No entanto, o comparecimento às consultas de higiene oral é elevado. “Estamos quase nos 90 por cento de assiduidade. Os pais estão mais despertos e tentam não faltar”, sublinha.
Profissionais reconhecem que o programa tem limitações
Ambas as profissionais consideram que o programa tem sido uma mais-valia ao longo dos anos, mas reconhecem limitações. Apenas duas higienistas cobrem todo o concelho de Vila Franca de Xira, o que restringe a capacidade de rastreio nas escolas. “Com mais higienistas conseguiríamos abranger muito mais escolas e fazer um trabalho ainda melhor”, avalia Filomena Jesus.
Além das crianças, o programa abrange grávidas, idosos com complemento solidário e utentes com VIH, mas as higienistas não acompanham diretamente esses tratamentos. “Os cheques são emitidos pelo médico de família e é o dentista da clínica quem faz o restante acompanhamento”, explicam.
Dúvidas sobre a escovagem ainda persistem
Apesar das dificuldades, ambas sublinham que as ações de educação para a saúde e a articulação com as escolas têm sido fundamentais para melhorar hábitos. “Os pais têm muitas dúvidas sobre a técnica de escovagem. É isso que mais ensinamos: como escovar, como usar fio dentário, quanto tempo dedicar”, relata Filomena.
O objetivo é simples: garantir que as crianças cresçam com melhor saúde oral e que o programa continue a reduzir a prevalência de cáries. Mas, para isso, deixam um apelo: “É fundamental que os pais utilizem os cheques dentista. Sem essa participação, o programa não chega tão longe quanto poderia.”








