Separar os restos orgânicos é uma rotina recente em Vila Nova da Rainha, onde a reciclagem dos biorresíduos porta-a-porta começa a mudar mentalidades. Poupar na fatura da água na componente dos resíduos é uma miragem, mas passo a passo, o futuro é este, o compromisso com um ambiente mais sustentável por parte da população de Vila Nova da Rainha. Com um simples contentor castanho, os moradores descobrem que contribuir para o ambiente pode ser mais fácil do que parece.
Na calma habitual de uma tarde em Vila Nova da Rainha, freguesia do concelho de Azambuja, o Valor Local foi conhecer o que anda a ser posto nos pequenos contentores castanhos de biorresíduos distribuídos recentemente. Pode parecer algo ainda pouco significativo, mas para esta comunidade, representa uma revolução silenciosa no modo como se lida com o lixo.
Pela primeira vez, os moradores da freguesia têm um sistema de recolha seletiva de biorresíduos porta-a-porta. Trata-se de um projeto-piloto que alia inovação, proximidade e sustentabilidade — e que já está a transformar hábitos, consciências e até conversas de vizinhança.

Maria Gracinda Pinto, foi uma das primeiras a aderir à iniciativa. Começou a dar nova vida aos restos de comida. A Ecoambiente vem despejar o contentor castanho à porta duas vezes por semana. Basta colocar de véspera o recipiente à entrada da sua habitação. O balde em causa é bastante hermético e os cheiros dos restos de comida não sobressaem.
São cerca de 400 habitações abrangidas nesta primeira fase. Cada uma recebeu um contentor castanho de 40 litros, entregue diretamente à porta, com instruções claras sobre o que colocar lá dentro: restos de comida, cascas de frutas e legumes, ossos, borras de café ou saquetas de chá. Tudo o que antes ia para o lixo comum, agora tem destino diferente.
O sistema é simples: os moradores separam os resíduos orgânicos durante a semana e colocam o contentor à porta às terças e quintas-feiras, dias de recolha definidos. A resposta tem sido surpreendente.

“Aderi logo”, conta Vanessa Sabino, mãe de um menino de sete anos. “Ele aprende sobre reciclagem na escola e foi quem me incentivou. Agora fazemos juntos. E quando se torna hábito, já nem custa.”
“Dá vontade de fazer mais”
Joana Antunes, outra moradora da freguesia, reconhece que nunca foi muito entusiasta da reciclagem. “Fazia o básico. Papel, garrafas, essas coisas.” Mas com a chegada do contentor castanho e das visitas dos técnicos, tudo mudou. “É muito diferente quando explicam pessoalmente. Percebe-se melhor. E dá vontade de fazer mais.”
Para ela, o impacto foi visível ao fim de poucos dias: “Achava que não tínhamos assim tanto lixo orgânico. Mas, quando se começa a separar, percebe-se o volume que isso representa.”
Mais do que um dever cívico ou ambiental, os moradores esperam que esta mudança também possa vantagens económicas. A separação dos biorresíduos pode ajudar a reduzir o valor da taxa de resíduos urbanos, frequentemente criticada por estar associada ao consumo de água — um critério considerado injusto, sobretudo em zonas residenciais com jardins ou hortas.

Uma freguesia-piloto que quer ser exemplo
Bruno Borda d’Água, presidente da Junta de Freguesia, acompanhou de perto o processo desde o início. Para ele, este projeto é mais do que um serviço público — é um exemplo de cidadania ativa.
“Fomos a primeira freguesia a avançar com esta medida, e isso enche-nos de orgulho. As pessoas foram envolvidas, houve contacto direto, e isso fez toda a diferença.” O autarca acredita que esta proximidade foi essencial para o sucesso da adesão: “Nem toda a gente aderiu de imediato, mas aos poucos vão-se juntando. Basta ver o vizinho a fazer para pensarmos: ‘Porque não eu também?’”
Câmara de Azambuja aposta na educação e no futuro
A iniciativa é promovida pela Câmara Municipal de Azambuja, com apoio técnico da empresa Ecoambiente. Para Ana Coelho, vereadora do Ambiente, este projeto representa uma etapa importante no cumprimento das metas nacionais e europeias de gestão de resíduos.
“Estamos a começar por aqui porque acreditamos na força do exemplo. Vila Nova da Rainha tem uma forte identidade comunitária e mostrou-se disponível para colaborar”, explica a autarca. “A reação foi excelente. As equipas estiveram no terreno, falaram com as pessoas, ouviram dúvidas. Isso aproxima a política da vida real.”
A próxima fase do projeto passa por expandir a recolha seletiva a zonas mais urbanas do concelho, onde a solução será adaptada: contentores públicos castanhos com abertura com cartão.
“O lixo de ontem pode ser o recurso de amanhã”. Além do impacto imediato — menos resíduos em aterro, menos maus odores, mais valorização — este tipo de separação abre portas para novos usos dos resíduos orgânicos: compostagem, produção de biogás, e redução de emissões.
Para muitos moradores, a experiência tem servido também como um alerta sobre os hábitos de consumo e o desperdício alimentar. “Separo mais, reaproveito mais, cozinho com mais atenção”, diz Joana Antunes. “A reciclagem não começa no caixote, começa na cabeça.”