Pensei em escrever este artigo, na sequência da assembleia municipal no concelho de Azambuja, onde pedi a palavra no final da sessão extraordinária, visando falar sobre o Dia Internacional da Mulher, comemorado a 8 de março. Situação que não foi permitida pela Presidente da mesa da assembleia. Neste artigo optei por relacionar a conquista das mulheres ao direito de voto e o projeto adiado na luta pela igualdade e direitos, bem distinta da afirmação da igualdade de género que muitos partidos gostam de defender como uma emancipação abstrata.
Quis a história em 2024 que a data fosse coincidente com o último dia de campanha eleitoral, onde os partidos agitaram bandeiras políticas e agendaram discursos e acções na rua e em espaços emblemáticos, para falar ao sentimento eleitoral das mulheres e da mudança sócio-económica para as faixas mais baixas da sociedade. Vimos de longe, de muito longe a lutar por um abril melhor e inteiro, em programas eleitorais datados e alguns com rupturas perigosas, dos valores do poder do povo. Nós não podemos vacilar e temos de contribuir decisivamente para consolidar a nossa democracia.
E surpreende os percursos de algumas mulheres na afirmação da democracia e isso é mérito seu, desassombrado e absoluto de vontade de cumprir abril sem medo de estigmas ou preconceitos e com liberdade de afirmar “prefiro não” ao populismo.
Quando vemos o nosso falhado sistema democrático a começar na base popular, poder local, sabemos que condicionamos o futuro. Não podemos adiar abril mais 50 anos. Os obstáculos são imensos no nosso tempo. Precisamos de estar preparados! As mulheres ao longo da história contemporânea da política nacional têm sido espectadoras e agentes do “cuidar” e acompanhar os tempos.
Somos mulheres no activo, mais escolarizadas, mulheres independentes em luta por uma significativa mudança na nossa condição social. Suportamos profissões liberais e académicas, desporto, forças armadas e forças de segurança. Continuamos a ser seres expostos a vulnerabilidade, a violência física e psicológica. Continuamos herdeiras da condição mulher.
Falar dos direitos das mulheres não precisa de permissão voluntária. É evidente que estamos longe de respeitar o princípio fundamental de valorizar a mulher, na sua frente cívica e política e no seu sentido identitário. Como deputada municipal encarei o momento como uma barreira ideológica e não política.
Quando se pergunta a todos presidentes de junta de freguesia, todos homens neste cargo, se têm algo a falar em detrimento de dar permissão para uma mulher falar sobre o dia da mulher, não damos o exemplo que devíamos, para reforçar o compromisso das mulheres e participação democrática. É preciso mudar e revolucionar as nossas comunidades de pertença.
Como deputada municipal desde outubro de 2021, desejo ver mais mulheres fazer parte do pilar do sistema democrático. Temos uma crise de princípios que está a enfraquecer a democracia todos os dias. Precisamos conquistar as mulheres para os centros de decisão e compromisso social em prol da causas humanitárias e pública. Não podemos ser meramente eleitoras, que de eleição para eleição transportamos o nosso voto. No dia 10 de março de 2024, assegurámos que os nossos mais velhos, pudessem votar. Precisamos de fecundar a democracia e maternar abril. Trazemos no ventre despojos antigos. Agora abril que mundo todo tens na barriga? Não somos mero peito de consolo, num abril que já não é mero obedecer, amiga.
Como diz a cantora Capicua “Vi-te a trabalhar o dia inteiro. A limpar a cidade dos homens.”
As mulheres não podem servir para portar o voto, ou ser assunto vão das redes sociais. Impacto em delicadeza submersa, numa espécie de estação de serviço onde outros recorrem por esquecimento, apenas durante 24 horas, ou quando é fácil usar o seu serviço de conveniência.
O cravo foi cercado de falta de direitos iguais e é preciso dar-lhe um novo abraço de liberdade. “Sempre foi fácil odiar e destruir. Construir e estimar é mais difícil”, Rainha Elizabeth II.
As mulheres não podem ser uma sombra voluntária, numa cortina de jogo hábil e político, somos parte e garantia da democracia, controlada ainda sempre pelos “ditos mais fortes, aqueles que usam o nosso voto, sem cumprir as promessas politicas sérias e inclusivas de natureza humana e social. As dinâmicas eleitorais não têm “cumprido” a dinâmica dos direitos.
Não podemos ter medo de escolher o nosso tempo de vida, escolher entre a nossa carreira e o direito aos outros tempos, não podemos ser obrigadas a aceitar lugares secundários. Somos livres para querer estudar, suportar encargos com habitação, ser família, queremos sonhar com as profissões do passado e do futuro.
Não podemos continuar sem acesso aos cuidados primários para grávidas e seus filhos, não queremos o serviço nacional de saúde adiado ou a prazo, sem blocos de parto para as mulheres darem à luz em segurança. Não queremos um fim de vida no campo da eutanásia. Que abril cinzento é este? É preciso renovar aquele abril todo de 1974.
Sentimos raiva e alegria e sabemos que a revolução é saber viver a cor da liberdade e participar na democracia activa e mudar as mãos que “ fecham” o nosso voto no sistema político em Portugal. Para onde avançamos? Quero agradecer ao meu colega de faculdade, Bruno Gaspar nesta obra atenta como percebeu a minha ideia, da mão que segura o voto durante os últimos 50 anos, tem que ser a mão que segura direitos de todos e de todas.
No passado dia 08 de março 2024, assinalamos novamente o Dia Internacional da Mulher. Importante reforçar a mensagem permanente de cuidar dos direitos e reconhecer o papel das mulheres na democracia, na liderança, no combate à discriminação salarial e social, contamos com as mulheres na ordem do mundo e na sua capacidade humana de mudar a vida dos mais próximos e das sociedades.
O direito ao voto em Portugal desde 1975 não distingue género e é um direito nosso por justiça própria. Sem condições, sem restrições sociais, sem limitação no acesso. Fazer valer os meus direitos não é uma “oportunidade”, é um princípio.
Não podemos desviar-nos deste caminho e descurar princípios e valores de identidade, nunca perder o sentido da vida. Onde houver uma mulher é para respeitar, na política, na cultura, no desporto, na sociedade e na vida privada.
Na proximidade de datas e celebração charneira o pensamento é dedicado aos 50 anos de abril. No horizonte as nações unidas cumprem em 2025 também 50 anos da “causa” dos direitos das mulheres, que são quantitativamente diferentes de continente para continente. Clara Zetkin, líder do gabinete da mulher alemão, fundou o dia internacional assente na igualdade de direitos e contra a marginalização da mulher em 1910, reivindicando o direito ao voto feminino. Uma mulher mudança e fundadora do socorro vermelho internacional.
Em Portugal a 05 de outubro de 1910 instaurámos a República Portuguesa. Foi preciso esperar até 1975 para que as Nações Unidas celebrassem o Dia Internacional da Mulher de forma global, no tempo do secretário – geral Kofi Annam (1997-2007).
Ser mulher na segunda metade do século XX em Portugal, radicou em respeitar a vontade da sua autodeterminação e evolução plena da condição de vida. Quis saber qualitativamente os desafios permanente no século XIX? Escutar as mulheres do tempo de abril é um dever democrático.
O poder local continua “parasitário” e pouco dinâmico, sem perceber que precisa de refundar e criar espaço para a participação política da mulher.
No velho normal, os homens falam as mulheres ouvem os discursos.
Os homens são os candidatos e as mulheres votantes, ou mera ausência do espaço eleitoral e das medidas de governo.
Temos que estabelecer equilíbrios e garantir que mais mulheres podem contribuir para o poder local, nos seus vários lugares e funções, só assim poderemos reforçar o papel das mulheres na democracia e dar espaço às eleitoras, confiando nas suas opções de voto.
Recordo do fundo da alma a minha avó materna que sabia determinar o seu “vou votar”, fê- lo sempre até a sua saúde resistir.
Hoje diz-se às jovens mulheres que votar fica bem, não podemos desistir de votar e não podemos apenas recorrer às redes socais para chegar a eleitorado “dito” jovem. Recuso-me a enquadrar a finalidade de uma campanha eleitoral ao instrumento dos seguidores das redes sociais ou outras ardilosas formas de propaganda política.
Este ano, o dia da mulher decorreu em “campanha eleitoral”. Foram muitos os que falaram da falta de direitos, clivagem cultural junto das eleitoras, elas que são mais escolarizadas, potencialmente numerosas na população, mas sem proporcional representação.
Este novo governo tomou posse com 7 ministras e 17 secretárias de estado, reforçando um fundamental reforço da presença da mulher junto do poder político. A Assembleia da República integra 230 deputados com assento no hemiciclo, em representação de nove partidos políticos. De acordo com o mapa oficial da eleição dos deputados eleitos para a assembleia da república, de 23 de março, em abril de 2024 temos 68 deputadas eleitas.
Finalmente após sucessivas eleições vemos umas eleições legislativas que invertem o sentido “ crónico” da abstenção. É com admiração que ainda vejo círculos eleitorais sem representação de mulheres no nosso parlamento em 2024, a referir Açores, Portalegre, Europa.
A escolha do presidente da Assembleia da República em abril de 2024 ficará para reflexão posterior, mas quero reforçar que elegemos uma vice-presidente mulher no mesmo dia, naquela votação final. Temos a salientar o lugar das mulheres no parlamento hoje, cinco deputadas líderes de bancada, e temos duas líderes de partidos, isso é Portugal que se quer democrático e moderado de forças extremistas.
Em abril de 2024 viu cessar funções o XXIII governo constitucional da democracia Portuguesa, de maioria PS e com ele também cessou assim funções a primeira ministra da defesa nacional de Portugal, Doutora Helena Carreiras, que durante dois anos assumiu a pasta da defesa nacional, num exigente momento de ameaças plurais, num Europa em guerra e num exigente paradigma das forças armadas e do papel da defesa nacional na conjuntura nacional e internacional e com um conselho de segurança da ONU a estabelecer uma nova ordem mundial.
A mulher e a democracia hoje? O que é ser eleitor? Por definição quem elege ou tem direito a eleger. Eu cresci numa aldeia do Minho e lembro-me de ir fazer o cartão de eleitor na junta de freguesia, assim que atingi os 18 anos. O meu cartão tem a data de 29/05/1998. Ainda guardo o cartão de eleitor na carteira. O que é ser eleitor? Quando falamos em voto de protesto ou em campanhas de seguidores de pessoas de certos partidos?
Lembrar que há 26 anos vivíamos um momento histórico na projeção internacional de Portugal, com a realização da Expo 98, Portugal democrático estava a revisitar a constituição e a realizar dois referendos nacionais, um relativo à despenalização da interrupção da gravidez, e o único referendo realizado sobre a regionalização. Nenhum dos referendos teve efeito vinculativo pois em ambos os casos o número de votantes foi inferior à metade dos eleitores inscritos no recenseamento.
É preciso analisar os percursores do tempo e sinais de outros países que estão a consagrar na Constituição regimes de proteção nacional dos direitos das mulheres como acontece em França desde 4 de março de 2024, que tem agora como direito constitucionalmente garantido a interrupção da gravidez na sua carta magna.
Perguntei à minha mãe quando foi votar pela primeira vez? Referiu o ano de 1979. Bom ter o seu testemunho! Foram as eleições intercalares de 2/12/1979, com apenas 5 forças políticas. Apenas 13 mulheres integraram o hemiciclo. Falamos das eleições da primeira aliança democrática.
Tenho a sensação que a história do regime democrático, precisa do tempo das mulheres.
Na poesia de Sophia de Mello Breyner Andresen “ Onde emergimos da noite e do silêncio e livres habitamos a substância do tempo”. As mulheres continuam a sentir falta de segurança e justiça. Exigimos delas deveres cívicos, mas não premiamos o mérito de quem tem carreiras de excelência e contributos firmados em todas às áreas de atuação política. Que força é essa que trazes nos braços e que ainda não preenche o abril inteiro?
Faz falta sentido de estado e criar opções de vida que façam acreditar na renovação política junto dos mais jovens neste período único e representativo.