A vereadora eleita pelo Chega, Inês Louro, em entrevista ao programa Hora Local da Rádio Valor Local, considerou “um dia negro para a democracia em Azambuja” o impasse que está a marcar o início do novo mandato autárquico. A autarca acusa a Câmara Municipal e o seu presidente, Silvino Lúcio (PS), de estarem a conduzir “uma jogada de secretaria” ao não aceitarem a sua retratação da renúncia ao cargo, apresentada logo após as eleições de 12 de outubro e retirada dias depois.
A questão divide juristas e coloca em confronto duas interpretações da lei. Por um lado, há quem entenda que a renúncia é um ato unilateral e irrevogável a partir do momento em que é comunicada por escrito à entidade competente. Por outro, a leitura do artigo 77.º do Regime Jurídico das Autarquias Locais aponta que o ato apenas se torna eficaz depois de formalmente aceite por deliberação ou despacho, o que, neste caso, permitiria a retratação antes dessa aceitação.
Inês Louro, também advogada, sustenta esta segunda posição. “O ato só se torna eficaz quando há notificação ou qualquer procedimento que demonstre que a Câmara iniciou a substituição do eleito. Isso nunca aconteceu”, afirmou, revelando que não recebeu qualquer resposta ao e-mail de renúncia enviado no dia 13, nem qualquer notificação posterior. “Retratei-me no dia 19, antes de qualquer ato produzir efeito. Tudo o resto é uma birra política”, sublinhou.
Autarca pondera recorrer ao Tribunal Administrativo
A vereadora assegura ter fundamentado juridicamente a sua posição com pareceres de juristas, incluindo da CCDR, e alerta para as consequências que poderão recair sobre o município caso a sua tomada de posse continue a ser recusada. “Se insistirem em não me deixar tomar posse, não terei outro remédio senão recorrer ao Tribunal Administrativo. E isso pode ter consequências graves, inclusive sobre a validade de deliberações camarárias. Se se provar que houve ilegalidade na instalação dos órgãos, tudo o que for decidido a seguir pode ser anulado.”
(Ouça a entrevista na íntegra a Inês Louro na Rádio Valor Local)
Presidente da Câmara acusado de tecer considerações machistas contra si
Num tom visivelmente indignado, Inês Louro acusou ainda o atual presidente de a ter humilhado em várias reuniões de Câmara. “Houve comentários de cariz pessoal e machista. O senhor presidente chegou a dizer, em plena reunião, ‘agora até andam a dormir juntos’, referindo-se a colegas da oposição. Mais tarde pediu-me desculpa ao telefone, mas nunca o fez em público”, revelou, acrescentando que o mandato anterior “não foi saudável” e que viveu “situações de claro bullying político”.
A eleita admitiu ter ponderado a renúncia por motivos de saúde e de ordem profissional, explicando que enfrenta um processo judicial complexo que coincidia com as reuniões camarárias. Contudo, após reflexão e apoio de colegas e militantes do partido, decidiu manter-se. “Percebi que tinha o dever de continuar. As pessoas que acreditaram em mim pediram-me que não as abandonasse. E eu não o vou fazer.” A eleita refere que o comportamento do autarca em muitas ocasiões configura “crime público” e que poderá agir em conformidade e queixar-se às entidades competentes para o efeito.
“Podem não gostar de mim mas sabem que sou séria”
Apesar do impasse, Inês Louro garante estar pronta para regressar às reuniões de Câmara “com a mesma força e sentido de rigor”. “Se há coisa que provei nestes quatro anos foi que estudei sempre todos os dossiês, que preparei todas as reuniões e que lutei pelo interesse público. Podem gostar ou não de mim, mas sabem que sou séria”, afirmou.
Questionada sobre o futuro político, Inês Louro admite que dificilmente será candidata nas próximas autárquicas. “Já tive dois chumbos da população. Neste momento diria que não voltaria a candidatar-me. Mas na política tudo muda muito depressa.”
Para já, o caso segue em análise jurídica, com a Câmara Municipal de Azambuja a aguardar parecer da CCDR-LVT. A tomada de posse dos eleitos está marcada para o próximo dia 29 de outubro. O Valor Local sabe que Inês Louro já enviou para a Procuradoria Geral da República e para a Comissão Nacional de Eleições a explanação dos seus pontos de vista sobre esta questão. Ao longo destes dias, o Valor Local tentou obter declarações de Silvino Lúcio que se refugia num comunicado de imprensa a emitir entretanto.








