A medição da economia através do Produto Interno Bruto (PIB), é a forma mais aproximada que temos para quantificar a realidade, apesar de ser um indicador com algumas limitações (não medindo tudo o que nela acontece). O PIB que define o rendimento anual de um país (e não a riqueza como ouvimos normalmente) demonstra-nos que Portugal gera 242,3 mil milhões de euros de rendimento (valores de 2022) e o consumo das famílias pesa 64% desse valor.
Como sabemos, o rendimento que obtemos só pode ter dois destinos (consumo e a poupança) e é o consumo das famílias que move a economia, em particular a economia portuguesa. O salário é o pilar fundamental da atividade económica, as receitas das empresas e os impostos cobrados pelo Estado variam no mesmo sentido que os salários. Sendo o salário o centro da economia e a partir dele depende tudo o resto.
Mas temos um problema estrutural: os nossos salários são baixos. Segundo os dados da Pordata, se retirarmos os efeitos das diferenças dos preços entre países, em 2023 Portugal é o segundo país da União Europeia com o salário médio mais baixo (dos 16 países com dados disponíveis). É pelos baixos salários que o nosso esforço fiscal é maior, que somos menos produtivos, que temos empresas de menor dimensão e que temos problemas sociais graves e estruturais. Sem o seu crescimento não é possível almejar melhor saúde, melhor educação e uma velhice digna.
Um dos exemplos desta realidade foi, no final de junho deste ano, um trabalho publicado pelo maior jornal semanário relativo aos maiores empregadores privados. E não podia ser mais dececionante. Dos 20 maiores empregadores, só 6 empresas pagam salários acima da remuneração bruta total mensal média (1.443 euros no 2º trimestre de 2023, segundo o Instituto Nacional de Estatísticas) e 7 pagam menos de 1.100 euros por mês.
Temos de ambicionar ter um nível de vida digno, ter uma classe média próspera e não ter pessoas que mesmo a trabalhar continuam a ser consideradas pobres
Num universo de 20 empresas que empregam 194 mil trabalhadores, não é possível manter esta realidade. É altura de mudar o paradigma e a mentalidade dos baixos salários. Não vale a pena serem definidos grandes objetivos de melhores retornos para os acionistas, quando as empresas não têm a sua base motivada. O fim da existência nos acordos de empresa de tabelas remuneratórias com salários abaixo dos 1.000 euros tem de ser a prioridade a curto prazo, conjugado com a atualização de todos os níveis salariais de uma forma proporcional. As empresas privadas não podem estar à espera de que o Estado dê o primeiro passo, por exemplo com a definição do valor de salário mínimo, para tomar as rédeas ao futuro do nosso país.
Temos de ambicionar ter um nível de vida digno, ter uma classe média próspera e não ter pessoas que mesmo a trabalhar continuam a ser consideradas pobres. Temos de ter salários que reflitam o esforço, a dedicação e a responsabilidade das pessoas. Um licenciado tem de ter a sua devida compensação pelo seu esforço (de 2011 para 2022, o prémio salarial da licenciatura passou de 50% para 27% face ao ensino secundário), um colaborador tem de ver a sua carreira evoluir de uma forma justa e constante ao mesmo tempo que as responsabilidades assumidas transportam a respetiva valorização salarial. Só assim, teremos uma sociedade melhor.
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Boa opinião. Bem estruturada e muito esclarecedora.