A campanha gastronómica “A Gula” decorre no concelho de Azambuja até 31 de outubro e volta a colocar em destaque aquele que é considerado o prato mais identitário do território: o torricado, confecionado com pão, azeite, alho e bacalhau.
Nesta edição participam 19 restaurantes distribuídos pelas diferentes freguesias do concelho, cada um com a sua interpretação do prato, mantendo porém o respeito pela tradição que o distingue. O evento tem vindo a afirmar-se como uma das principais iniciativas de promoção gastronómica do município, conjugando a vertente turística com a preservação da memória coletiva local.
A Gula nasceu precisamente com o propósito de valorizar o torricado e os produtos da terra, criando um roteiro de sabores que liga as freguesias e atrai visitantes de várias regiões. Ao longo das últimas edições, o certame consolidou-se como um dos mais relevantes momentos de dinamização da restauração local, contribuindo para o movimento económico dos estabelecimentos e para a afirmação do concelho como destino de turismo gastronómico.
Segundo o vice-presidente da Câmara Municipal de Azambuja, António José Matos, o balanço da edição deste ano é positivo, ainda que o clima tenha desempenhado um papel inesperado. “Tem feito muito calor e o torricado é um prato de conforto, que se aprecia mais no tempo frio. Com o calor não puxa tanto, mas o feedback é bom”, refere o autarca.
O responsável destaca também o crescimento da notoriedade da iniciativa fora das fronteiras do concelho. “Este ano voltámos a apostar numa comunicação mais direcionada para a área metropolitana de Lisboa e o resultado nota-se. Temos tido muitas pessoas de Lisboa, de Cascais e de outras zonas que vêm propositadamente a Azambuja para provar o nosso torricado. Algumas até repetem a visita noutros fins de semana”, adiantou.
Para António José Matos, a Gula é mais do que um evento gastronómico, é uma forma de preservar um símbolo da cultura local e de o transformar num produto de negócio sustentável para os restaurantes. “Queremos que os estabelecimentos percebam que há mercado e que o torricado é rentável. É uma forma de afirmação da nossa identidade e de promoção do concelho. Quem prova, repete”, sublinha.
O autarca lembra que o torricado nasceu nos campos de Azambuja, feito tradicionalmente pelos homens que trabalhavam no campo, e que hoje é uma referência incontornável da cozinha ribatejana. “É a comida dos nossos avós, feita com o que havia à mão, pão, azeite e alho, e que se transformou num prato de sabor único, muito procurado por quem nos visita. As pessoas já associam o torricado à Azambuja e procuram-no durante todo o ano. Uns restaurantes têm-no sempre disponível, outros apenas ao fim de semana, mas há procura e isso mostra que o caminho está certo”, acrescenta.
O vice-presidente defende que esta estratégia deve continuar a ser reforçada, não apenas através da promoção sazonal, mas também com o incentivo para que os restaurantes mantenham o torricado nas suas cartas de forma permanente. “A gastronomia é hoje uma ferramenta poderosa de promoção territorial. Queremos que o torricado seja o nosso cartão de visita, como a lampreia é em Penacova ou o leitão na Bairrada”, conclui.

Vice-presidente elogia esforço dos restaurantes e aponta falhas no Valverde
Durante a entrevista, ao Vcalor Local, António José Matos destacou o empenho dos restaurantes participantes e o impacto positivo que a iniciativa tem vindo a gerar nas economias locais. Sublinhou, no entanto, que há ainda aspetos a melhorar. Segundo o autarca, algumas cozinhas de menor dimensão continuam a enfrentar dificuldades em servir o torricado de forma regular, sobretudo por questões de espaço e equipamento.
“Há restaurantes que não têm condições para o fazer todos os dias, mas outros já o servem durante todo o ano. A ideia é que cada vez mais estabelecimentos mantenham o prato nas suas ementas, porque o torricado tem público e é um produto com futuro”, referiu.
O vice-presidente lembrou que a Câmara tem procurado envolver as freguesias e as associações locais neste esforço de valorização, transformando antigas festas populares em eventos de cariz gastronómico centrados no torricado.
“O turismo gastronómico é hoje uma das formas mais fortes de promoção de um território. Há quem percorra muitos quilómetros apenas para provar um prato ou conhecer uma tradição. É isso que queremos continuar a fazer em Azambuja.”
Apesar do balanço positivo, António José Matos reconhece que há dossiês pendentes. Um dos casos mencionados foi o do restaurante do Valverde, concessionado pela Câmara Municipal. “Teve vários episódios que não correram bem e temos de voltar à carga com esse assunto para o resolver de uma vez por todas. Não vai ser um tema fácil, mas terá de ser resolvido. Tudo tem solução, menos a morte”, afirmou.
O autarca sublinha que, em geral, os restaurantes do concelho registam boa afluência e que isso é reflexo do trabalho feito nos últimos anos. Ainda assim, identifica freguesias que continuam sem qualquer oferta de restauração, o que limita a expansão da marca gastronómica do município.
“Há zonas, como Vale do Paraíso, onde o torricado é feito com enorme orgulho e qualidade, mas não existem restaurantes. A Câmara não pode abrir restaurantes, tem de ser a iniciativa privada a perceber o potencial e a avançar. Se houvesse restauração em Vale do Paraíso, com o torricado e os produtos locais, seria certamente um sucesso.”
Para o autarca, o desafio passa agora por garantir que o torricado esteja presente de forma permanente e diversificada em todo o concelho, reforçando o sentimento de pertença e de identidade associado ao prato.

Certificação do torricado tem sido um processo mais difícil do que o esperado
A certificação do torricado tem sido uma das prioridades da Câmara Municipal de Azambuja, mas o processo revelou-se mais exigente do que inicialmente previsto. António José Matos admite que o caminho tem sido complexo, mas garante que o objetivo se mantém firme.
“Não imaginávamos que fosse tão trabalhoso e que fossem exigidas tantas etapas. Estamos a tentar levar o processo a bom porto e não baixamos os braços”, afirmou o autarca, sublinhando que a certificação é essencial para consolidar a autenticidade do prato e garantir que a sua origem se mantém ligada a Azambuja.
De acordo com o vice-presidente, a autarquia tem vindo a promover o torricado em múltiplos contextos, dentro e fora do concelho, com o propósito de reforçar essa ligação. “Sempre que participamos em feiras ou eventos regionais levamos o torricado connosco. Hoje, toda a gente já reconhece que este prato é da Azambuja”, destacou.
Matos considera que a certificação permitirá dar um novo impulso à promoção do prato, ao mesmo tempo que assegura a preservação das suas características originais. “Não queremos inventar. O bacalhau com torricado é o que é nosso, o que é genuíno e tradicional. Podemos aperfeiçoar alguns pormenores, mas não podemos mudar a essência, porque deixaria de ser torricado. É essa autenticidade que queremos salvaguardar.”
O autarca acrescenta que o atual mandato deverá marcar uma nova etapa na estratégia de valorização da gastronomia local. “Será um mandato de continuidade, mas também de reforço. Vamos manter o foco na promoção do torricado, na consolidação da marca e na criação de mais oportunidades para que a restauração local cresça em torno deste produto.”
A Gula encerra a 31 de outubro, mas o município pretende que o espírito da iniciativa se prolongue durante todo o ano, com o torricado a afirmar-se cada vez mais como símbolo gastronómico e cultural de Azambuja.








