Quando nos confrontamos com a marcação de um novo ato eleitoral e sendo o momento dos partidos políticos se comprometerem com soluções para os problemas do país, não é tarde para nos fazermos ouvir.
Portugal é um país com grandes fragilidades ao nível social. Nas últimas décadas, houve a incapacidade de resolução de um dos nossos maiores flagelos, a pobreza. O nosso país é confrontado com um nível de risco de pobreza que ronda os 40% (40,3% no ano de 2023), onde mesmo após todas as transferências do Estado (desde pensões a outras prestações sociais) o risco de pobreza atinge os 16,6% (valores de 2023). O que nos leva à conclusão de que, apesar de todo o esforço financeiro realizado (existindo diferentes visões sobre a sua eficiência e eficácia) ainda ficam 16,6% das pessoas em risco. Ao mesmo tempo, as estatísticas demonstram que o facto de um posto de trabalho estar ocupado, não inviabiliza o desaparecimento do risco de pobreza (e é assim para cerca de 9% das pessoas que trabalham).
À pobreza juntam-se os preços da habitação que superam os valores das maiores capitais europeias, o preço dos bens e serviços básicos são semelhantes aos países mais prósperos do continente europeu, a única coisa que não nos podemos orgulhar é dos nossos salários serem comparáveis aos do centro da Europa. Não existe assim, alternativa a um choque salarial para o nosso país.
Não nos enganemos com a teoria de que os salários têm de acompanhar a produtividade da economia. Se o preço da habitação ou os preços dos bens e serviços básicos não tiveram em conta a variação dos salários, por que razão as pessoas têm de ver a recompensa pelo seu trabalho esperar pela possível subida da produtividade da economia? Em bom rigor, a produtividade só crescerá se existirem trabalhadores motivados com os seus salários.
Para 2023, o Eurostat (o gabinete de estatística da União Europeia) calculou que os espanhóis ganham mais 9.654 euros por ano do que os portugueses. Atingir em Portugal um salário médio equivalente a Espanha, com a carga fiscal aplicável neste momento, o Estado português poderia arrecadar mais 14 mil milhões de euros de IRS e Segurança Social (com os impostos e contribuições pagas diretamente pelos salários) por ano.
Na Segurança Social, este choque salarial permitiria que os 5 mil milhões de euros provenientes dos 11% pagos pelos trabalhadores, aumentar todas as atuais pensões em 20%. Tendo um impacto estrutural na redução da pobreza nos mais idosos, penalizados pelas baixas carreiras contributivas (a Segurança Social dá os primeiros passos na década de 70, mas oficialmente só nasce em 1984) e pelos baixos salários da época. Já os 9 mil milhões de euros conseguidos em IRS, poderíamos reduzir a taxa normal de IVA para os 21% (a mesma taxa praticada em Espanha), reduzir os impostos sobre as empresas ao nível da Irlanda (12,5%) e ainda sobrava dinheiro para abater à dívida pública.
O impacto de um choque salarial vai muito além do ganho financeiro. A motivação, a felicidade, a melhoria de vida da população ou a ambição ganha pela nova perspetiva de vida de não ter de fazer contas para que o mês não seja mais comprido que o salário, é de um valor incalculável para o país. Por isso, estando nós com eleições à vista, devemos perceber que o único choque que o país precisa, é mesmo o choque salarial.