Um folheto de uma dada insígnia da distribuição alimentar espalhada pelo País. E, entre outras ofertas, a de “leitão assado – cuvete 7,99 € /unid. – 500 g – 15,98 Kg”.
O consumidor, no dia imediato ao do lançamento do folheto, desloca-se a um estabelecimento, fora de portas, a mais de 4 Km, e “dá com o nariz na porta”: “nós aqui não vendemos; só num outro híper, no Retail Park.”
O consumidor objecta: mas no folheto aqui disponível aparece essa oferta.
Lê de novo o folheto. E, em letra microscópica, surge, com efeito, a referência “os artigos presentes neste folheto poderão não estar disponíveis em todas as lojas. Consulte as lojas aderentes em…”
Resolve, então, para satisfazer um capricho, deslocar-se ao Retail Park: mais 14 Km de percurso.
Ali chegado, dá de novo com o “nariz na porta”.
“Não, nós só vendemos o que está ali na tabela: leitão até 5 Kg. 28,99 €, acima de 6 Kg., 22,99 €, e mais especificações… com cabeça, sem cabeça…”.
Mas o do folheto nem vê-lo…
Estas manobras são legais?
A informação tem de ser séria, rigorosa, objectiva e adequada: informação é informação total (Lei-Quadro de Defesa do Consumidor: n.º 1 do art.º 8.º).
Afirma a Cons.ª Clara Sotto Mayor, no acórdão Vodafone de 02 de Fevereiro de 2022, que não é o consumidor que tem de ir em busca da informação. No caso, ao paradeiro das lojas aderentes: é o fornecedor que tem de prestar a informação na íntegra, sem excepção. Para que ninguém vá ao engano…
Além do mais, em conformidade com a Lei das Condições Gerais dos Contratos,
“São em absoluto proibidas … as cláusulas contratuais gerais que: … se encontrem redigidas com um tamanho de letra inferior a 11 ou a 2,5 milímetros, e com um espaçamento entre linhas inferior a 1,15» (DL 446/85: al. c) do artigo 8.º e i) do artigo 21).
A violação do que neste passo se prescreve constitui agora contra-ordenação económica grave passível de coima: tratando-se de uma grande empresa – entre os 12 000 e os 24 000 €.
A publicidade-isco (ou chamariz) constitui de análogo modo uma prática comercial desleal (enganosa):
“São consideradas enganosas, em qualquer circunstância, as seguintes práticas comerciais: … propor a aquisição de bens ou serviços a um determinado preço e, com a intenção de promover um bem ou serviço diferente, recusar posteriormente apresentar aos consumidores o bem ou o serviço publicitado.” (DL 57/2008: al. f) do art.º 8.º).
Tal prática enquadra-se nas contra-ordenações económicas graves.
A forma como esta insígnia publicita levianamente os seus produtos, dizendo designadamente, no que toca a preços, que os valores indicados podem não estar correctos “por erro tipográfico “, procurando daí lavar as mãos como Pilatos, reflecte bem a ausência de uma cultura empresarial de respeito pela dignidade do consumidor e pelas leis em vigor.
Perguntava-nos, vexado, o reclamante: “Sim, quem me paga o combustível que gastei em duas deslocações frustradas de cerca de 30 Km, para vir de mãos a abanar? Quem me paga o combustível, ao preço a que está?”
Há que usar a livro de reclamações e lavrar, nestas circunstâncias, o fundado protesto por todas estas artimanhas saloias dos fornecedores. Mas que resultam, quantas vezes!
A ASAE, com competências no mercado em geral, que analise as práticas fraudulentas que por aí abundam e causam significativos prejuízos a todos e ao país
Mário Frota
presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO – Portugal