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Santo Estevão e a segunda vida do aeroporto paredes meias com a freguesia

É fim de tarde em Santo Estevão. Pelos cafés da localidade do concelho de Benavente há quem não desdenhe uma cerveja antes da hora de ir para casa jantar. As relações de vizinhança ainda são fortes, e agora salpicadas pela onda de imigração, em que muitos cidadãos dos territórios do Indostão, mas também do Brasil passaram a fazer parte da paisagem populacional. Estão bem inseridos é o que nos dizem. Em Vila Nova de Santo Estevão vivem famílias mais abastadas que há poucas décadas descobriram os encantos da vida no campo no Ribatejo. Santo Estevão é a localidade que pode sofrer mais com o impacte do aeroporto. Ainda não é conhecido o desenho das pistas, mas sobretudo importa que esta história não seja mais um disco riscado do que sucedeu em 2008, quando as pistas foram deslocalizadas dois quilómetros para norte com possibilidade de afetar ainda mais a freguesia. O novo aeroporto desenvolve-se a 45 quilómetros de Lisboa junto à Reta do Infantado entre as freguesias de Samora Correia e Santo Estevão no concelho de Benavente e Canha no Montijo.

Entre a população há um sentimento positivo quanto à vinda do aeroporto. Rui Rodrigues, é natural da localidade, e acredita que esta foi a melhor escolha por parte do Governo. O habitante acredita que a freguesia vai ficar sujeita à pressão imobiliária mas no bom sentido. “Isto vai ficar tudo cheio pois em meia dúzia de minutos qualquer um põe-se no aeroporto”. As expetativas são boas na sua opinião, porque a infraestrutura “pode dar emprego às pessoas da terra”. Prevê-se que comece a receber passageiros dentro de 15 anos. Até lá a Portela vai sofrer obras para dotar o aeroporto atual de melhores condições.

Na coletividade local vários homens reúnem-se para o momento de convívio de fim de tarde. Jesuíno Pinto também é da opinião que o aeroporto vai ser algo bom para a freguesia e que vem dar trabalho a quem lá vive. Aquando do primeiro anúncio do aeroporto em 2008, a freguesia sofreu com as medidas preventivas do aeroporto, com a limitação da construção. “Agora sinceramente não sei qual vai ser o futuro. Calculo que o interesse na construção vai aumentar”.

“O aeroporto comporta prós e contras. Num futuro próximo pode aumentar as rendas das casas. Ou seja, só vai ser bom para os ricos. Neste momento, a oferta de habitação já é escassa. Há quem comece a aproveitar-se. Sei de casas que estavam a 80 mil euros e agora a 100 e tal mil. Concordo com o aeroporto, mas estamos a falar daqui a 20 anos.”, reflete outro habitante, João Paulo. Para si, o anúncio de 2008, “foi estratégico para agora darem como consumado este anúncio final e poderem inflacionar tudo aqui à volta”. Até que o aeroporto seja uma realidade, Santo Estevão “vai ter de melhorar muito a vários níveis”. A freguesia, conta, chegou “a ter mais movimento do que Benavente”. Nem a chegada dos novos habitantes a viverem em residências de luxo conseguiu fazer com que Santo Estevão “desse aquele salto”. “Quanto a mim não alavancaram nada a terra”, que neste momento “já nem conta com qualquer agência bancária”, e dinheiro no multibanco “só tem duas vezes por mês”. “É uma terra esquecida, principalmente pela Câmara”. João Paulo pensa que de uma maneira ou de outra a população vai adaptar-se à nova realidade do aeroporto, com aviões a passar perto das suas casas.

Michel Gusman é um dos novos habitantes da freguesia. Brasileiro, viveu primeiro no Carregado, mas foi em Santo Estevão que assentou arraiais, muito por culpa das casas serem mais baratas. “Gostei disto aqui, é um lugarzinho mais calmo e pago metade do que pagava antes”. O aeroporto, calcula, que possa colocar em risco “a questão do sossego”. O imigrante trabalha como motorista na Marinhave, uma empresa local, e acredita que o aeroporto também possa “vir a ajudar a população com mais emprego”.

Já Lúcio João acredita que o aeroporto vai trazer mais valor para os negócios da terra, quer restaurantes, quer outros. “As nossas casas também vão ficar mais valorizadas”, acredita. Desde que o Governo anunciou em maio a localização do novo aeroporto que “o negócio da construção está a mexer mais”.

Olívia Nunes é lojista. Tem uma pequena loja gourmet na aldeia que atrai todo o tipo de clientela, desde os habitantes de Santo Estevão até aos que vivem nos condomínios de luxo de Vila Nova de Santo Estevão. Tem por isso conhecimento de várias opiniões sobre o aeroporto. Se a população da sede de freguesia vê com bons olhos a infraestrutura, já os que foram viver para Vila Nova não podem nem ouvir falar. Não era este o futuro sonhado, com a possibilidade de aviões a passar perto das suas casas. Quanto à sua opinião pessoal é perentória – “Penso que vá tirar alguma da nossa ruralidade, mas é o futuro. Temos de evoluir e não estagnar”. Olívia é fã da freguesia. Apesar de a empresária também ter uma loja semelhante em Benavente, e de viver na sede de concelho, estar todos os dias em Santo Estevão com uma casa comercial “é muito giro”, “porque tenho clientes que vão desde o cidadão mais simples ao mais mediático”. Também em Vila Nova de Santo Estevão ou na Mata do Duque vivem estrelas da televisão, políticos, futebolistas, entre outros. “Todos eles são importantes, desde o senhor Gafanisca (pessoa conhecida na terra) até ao indivíduo que me compra champanhe caro na loja”. “Agora temos uma comunidade muito grande de brasileiros, ucranianos, paquistaneses que são pessoas muito bem integradas. Sem dúvida que temos uma imigração desenfreada, mas são estas pessoas que estão a trabalhar em muitos dos negócios aqui na zona, por falta de mão de obra portuguesa”, avalia neste momento a localidade. A aldeia “é muito tranquila, pode-se andar na rua a qualquer hora”, finaliza.

O Valor Local contactou Nelson Norte, presidente da junta de freguesia de Santo Estevão, que num primeiro contacto disse estar interessando em ser ouvido para este trabalho, mas depois mostrou estar indisponível.

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Carlos Coutinho insistiu junto do ministro para afastar as pistas de Santo Estevão

Carlos Coutinho acredita que linhas vermelhas do novo PDM vão evitar o pior

Carlos Coutinho, presidente da Câmara de Benavente, acredita que esta é a melhor solução para o país, mesmo depois de o concelho ter sofrido com os reveses de 2008 quando a construção teve de parar devido às medidas preventivas, com a possibilidade de as pistas do aeroporto ficarem demasiado próximas de Santo Estevão. O autarca de Benavente reuniu-se na passada semana com o ministro das Infraestruturas, Miguel Pinto Luz, tendo transmitido essa mesma preocupação.

Entre as necessidades do concelho estão ainda as redes viárias com necessidade de requalificação da Nacional 118, e a criação das demais infraestruturas de apoio à população, e o desafio para toda a região que é o acesso ao TGV em alta velocidade Lisboa-Madrid.  Em especial, Carlos Coutinho evidenciou a Miguel Pinto Luz os efeitos negativos da proximidade das pistas da infraestrutura aeronáutica à freguesia de Santo Estêvão.

Ao Valor Local, Carlos Coutinho salienta que a aprovação do PDM em 2022, já se adequa à realidade do novo aeroporto, “quer do ponto de vista da localização de atividades económicas, quer no que se refere a um previsível aumento demográfico”. “O nosso instrumento de gestão do território criou as balizas daquilo que é para nós um desenvolvimento sustentado”. Aqui “há linhas vermelhas que não podem ser ultrapassadas num território como o nosso tão diferenciado, com a nossa vasta paisagem florestal e agrícola que não deve ser tocada”. Para já os estudos apontam para o abate de 42 mil sobreiros no polígono do futuro aeroporto, algo que o autarca não inscreveria no desiderato afirmado.

Quanto às futuras medidas preventivas que possam vir a ser desenhadas à semelhança do que aconteceu em 2008, estas assentavam na proibição ou na sujeição a parecer obrigatório sempre que se quisesse criar núcleos populacionais, construir, reconstruir ou ampliar edifícios, instalar explorações, alterar uso de solos, derrubar ou plantar árvores em maciço ou instalar redes de comunicações. Chegaram às mãos das entidades 279 pedidos, de acordo com a comunicação social à época, dos quais 42 foram indeferidos. 81 por cento da área do novo aeroporto fica no concelho de Benavente. Carlos Coutinho diz estar desperto para essa provável realidade, tendo em conta o Estudo de Impacte Ambiental que venha a ser produzida, já que o elaborado em 2010 encontra-se caducado.

Principalmente o município não quererá sofrer um novo logro como aquele que aconteceu aquando do primeiro anúncio “em que por artes mágicas e de um momento para o outro mexeram na orientação das pistas”. António José Ganhão, antigo presidente da Câmara de Benavente, chegou a afirmar que o Governo à época queria transformar Santo Estevão na nova Aldeia da Luz. Carlos Coutinho acredita que os interesses da freguesia serão acautelados como de resto acabou por ser garantido já na reta final do processo anterior pela Novo Aeroporto (NAER), SA. Em linha reta, Santo Estevão, o aglomerado populacional com maior número de pessoas, ficará a sete quilómetros do novo aeroporto, o equivalente atualmente a algo como, grosso modo, Portela- Belém, na cidade de Lisboa.

Pressão imobiliária ainda é pouco visível

No âmbito deste trabalho, o Valor Local contactou também os vários promotores imobiliários. A Mata do Duque é um dos principais operadores nesta área. Com um vasto leque de propriedades infraestruturadas com áreas entre os 20 e os 35 mil metros quadrados, tornou-se o paraíso de uma classe mais abastada que procura na tranquilidade do campo na freguesia de Santo Estevão uma outra qualidade de vida que a grande capital já não oferece, estando a 30 minutos da Ponte Vasco da Gama, o que permite ir e vir todos os dias para quem trabalha em Lisboa. Apresenta ainda como atrativos a possibilidade de prática de desportos equestres e de golf. Ao nosso contacto, a responsável da empresa que gere este complexo imobiliário adianta logo que não está disponível para prestar muitas declarações.

“Neste momento aquilo que possa dizer não traz grande valor acrescentado, não tenho como dizer se terá ou não impactes e como tal não quero estar a especular”, é nos dito.

O anúncio do aeroporto terá caído como um balde de água fria a muitos dos que escolheram o local para viver. O Valor Local aquando do recente anúncio do aeroporto entrou em contacto com Henrique Chaves, antigo ministro e um dos moradores, que chegou a ser bastante interventivo aquando do anúncio de 2008, tendo até desmontado em reunião pública, o verdadeiro sentido da orientação das pistas previsto naquele que era uma espécie de primeiro esboço da infraestrutura. O morador desta vez não quis prestar declarações, mas continua a ser um opositor de um aeroporto no local.

Com experiência no mercado de Santo Estevão, o agente da Remax Siimgroup Countryside, Nuno Rolo, revela que já se nota alguma procura de terrenos na freguesia, principalmente por parte de “construtores com perspetiva de investimento” com esperança de “retorno no futuro”. Já quanto à procura de casas “aumentou em Vila Nova de Santo Estevão, mas não devido ao aeroporto, mas porque há cada vez mais pessoas interessadas em vir para cá”. A localidade em causa ainda tem muito espaço para se desenvolver do ponto de vista habitacional. Atualmente cerca de 150 habitações de luxo são habitadas de forma permanente. Pelo que percebe dos seus clientes “ainda estamos numa fase muito inicial e não se consegue perceber bem o que vai acontecer”, comenta quanto às expetativas dos residentes. O cliente que deseja morar em Santo Estevão “procura casas com tipologia T3 ou T4 com espaço exterior”.

Também presente no mercado imobiliário de Santo Estevão, Miguel Queiroz, da imobiliária UAT HOME, refere que não tem sentido nenhuma evolução assinalável desde o anúncio do aeroporto. Atualmente está a vender uma moradia com terreno na Mata do Duque, “mas até à data não apareceram muitos compradores, espero que apareçam, pois a notícia do aeroporto pode valorizar a zona”.

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